crónica por maria miguel vaz
Saquei a rolha de uma garrafa de vinho tinto do Douro, olhei-a com atenção, cheirei o topo húmido, servi o copo, agitei levemente o vinho lá dentro, inspirei junto à borda do copo e na ânsia de provar, bebi um trago. Soltei um sorriso e pensei: “Desde quando é que começaste a fazer isto?!”, não tinha nunca reparado naquele ritual quase involuntário.
Depois do odor me ter parecido forte e complexo, o paladar atestou de forma indubitável o que havia pensado. Soube-me a algo diferente, pouco familiar. Assim que li o contra rótulo, tirei as teimas! Para além das minhas castas de eleição, Aragonês e Touriga Nacional, mencionava Tinta Barroca. Casta estranha para uma novata pouco conhecedora e fiel aos tintos do Dão. Tinta Barroca é característica da região do Douro e marca o vinho com aromas florais, neste caso amaciando a robustez do paladar das outras duas castas. Ilude-nos com a sensação de delicadeza e fragilidade que contrasta com a sua resistência a pragas e doenças. De carácter forte e bagos marcados pela grande concentração de açúcar, permite a produção de vinhos com um generoso teor alcoólico.
Apercebi-me, então de que tinha encontrado um Douro no meio do meu Dão, uma casta tão genuína e tão cheia de sabor, capaz de por si só representar uma região inteira.